Por: Camila Duarte Ritter
A Amazônia abrange extensas florestas em áreas que são periodicamente inundadas por rios que transbordam sazonalmente. Dois determinantes são decisivos para a extensão das florestas inundadas periodicamente na Amazônia. O primeiro é a distribuição anual desigual das chuvas. Na maior parte da Amazônia, a estação chuvosa é seguida por um período mais seco que dura vários meses. O segundo é a topografia da bacia amazônica e suas várzeas baixas. Combinados, esses fatores levam a um aumento anual na descarga fluvial que causa um enorme pulso de inundação sazonal (Junk et al. 2020). Além disso, a profundidade e a duração da inundação nas florestas variam de acordo com a inclinação do terreno e a distância aos principais corpos d’água. Isso cria um gradiente de inundação da floresta inundada sazonalmente mais baixa até a floresta não inundada, que afeta diretamente a biota.
Figura 1. O nivel de água varia em diversos metros sazonalmente nos rios amzônicos, inundando as florestas adjacentes. A profundidade e a duração que as florestas ficam inundadas variam de acordo com a inclinação do terreno e a distância do rio, criando um gradiente de inundação que afeta diferentemente a biota dessas florestas.
A duração da inundação é indicativo da diversidade e composição da comunidade de árvores (Bredin et al. 2020). Além das árvores, outros organismos como os que vivem no solo devem ser afetados pela inundação, porém não sabemos como. Globalmente, a biota do solo é reconhecida por sua importância para a saúde do mesmo e por disponibilizar nutrientes para a comunidade de plantas (Fig. 2). Além disso, tanto a biota subterrânea quanto as plantas podem afetar a estrutura do solo e a composição das espécies por meio da secreção de diferentes compostos químicos que inibem ou facilitam a distribuição de determinadas espécies (Bennett et al. 2017). Assim, a biota subterrânea desempenha um papel fundamental na formação do habitat das plantas, e vice-versa.
Figura 2. Organismos do solo são fundamentais para a fucionalidade dos ecosistemas. Por exemplo, invertebrados de solo são responsáveis por processar grandes quantidades de detritos e torná-los disponíveis para outros organismos. Da mesma forma, os microrganismos são essenciais para a ciclagem de nutrients e os fungos ectomicorrízicos, fungos que estão associados mutualisticamente (relação biológica que ambos organismos se beneficiam) com plantas, estão na base de processos do ecossistema, como a ciclagem de carbono do solo. Essas e outras relações mutualísticas influenciam a diversidade de espécies, a produtividade do ecossistema e a composição da comunidade
Em regiões tropicais hiperdiversas, como a Amazônia, há um conhecimento muito limitado sobre a biodiversidade subterrânea e suas interações com a biota acima do solo ao longo de gradientes de disponibilidade de recursos e estresse ambiental. Para entender o efeito do gradiente de inundação no organismos de solos nós utilizamos amostras de serra pilheira e solo para extrair o DNA presente nessas amostras e sequenciá-los com a abordagem de metabarcoding. Com essa técnica foi possível caracterizar a diversidade e a composição da comunidades subterrâneas e relacioná-las com a diversidade de árvores. Nós verificamos que tanto o gradiente de inundação quanto a diversidade de árvores não explicam a biodiversidade de animais, fungos e protistas abaixo do solo. No entanto, o gradiente de inundação e a diversidade de árvores explicam em parte a composição da comunidade de bactérias do solo (Bredin et al. 2021).
Quer saber mais sobre o trabalho? Ele está disponível nesse link:
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/edn3.268
Referências:
Bennett, J. A. et al. 2017. Plant-soil feedbacks and mycorrhizal type influence temperate forest population dynamics. – Science (80-. ). 355: 181–184.
Bredin, Y. K. et al. 2020. Structure and Composition of Terra Firme and Seasonally Flooded Várzea Forests in the Western Brazilian Amazon. – Forests 11: 1361.
Bredin, Y. et al. 2021. Above-and below-ground biodiversity responses to the prolonged flood pulse in central-western Amazonia, Brazil. – bioRxiv in press.
Junk, W. J. et al. 2020. Large rivers and their floodplains: Structures, functions, evolutionary traits and management with special reference to the Brazilian rivers. – Introd. Large Rivers: 55–101.