Segurança Alimentar: Contaminação de ostras por Salmonella sp.
Por Aline Horodesky
Publicado em 25/05/2015
As ostras possuem hábito alimentar filtrador, alimentando-se principalmente de partículas em suspensão na água. Suas duas valvas são mantidas relativamente abertas por onde entra a água com o alimento. Mais especificamente, a alimentação provém de um fluxo de água, que passa através das cavidades do manto, após passa pelas brânquias, as quais funcionam como um filtro que concentram partículas orgânicas, algas microscópicas e organismos planctônicos.
Figura 1: Anatomia interna das ostras. Fonte: GIA
A capacidade filtradora de uma ostra é de aproximadamente 10 litros de água por hora e cerca de 200 a 250 litros por dia. Por apresentar essa capacidade, são consideradas também reservatórios de inúmeros patógenos humanos, já que podem bioacumular primariamente bactérias, como as dos gêneros Salmonella e Shigella, vírus entéricos e protozoários, devido à possíveis contaminações fecais nos locais de cultivo.
Além disso, a ostra está entre um dos principais grupos de alimentos relacionados à ocorrência de Doenças Transmitidas por Alimentos – DTAs.
Quando ostras, ao serem ingeridas crus (in natura) ou mal cozidas, funcionam como veículos de transmissão, podendo provocar sintomas e doenças sérias aos seres humanos. Caso o processamento e preparo não seja realizado de forma correta para remover (depuração) ou destruir (cozimento) os micro-organismos patogênicos ou toxinas, o consumo de ostras pode representar um perigo à saúde pública.
Figura 2: Ostras in natura para consumo humano. Fonte: Enoeventos
Outro fator que influencia na qualidade das ostras é o tempo de deterioração (influenciada pela quantidade e pelo tipo de micro-organismos presentes inicialmente) das ostras após serem retiradas da água. Durante o processo de transporte e estocagem, os fatores desfavoráveis como menos oxigênio, acúmulo de dejetos e interrupção da alimentação promovem uma alteração na microbiota. Além desses fatores, a temperatura de estocagem exerce uma forte influência na diversidade desta microbiota.
A taxa de multiplicação dos micro-organismos é altamente dependente da temperatura. A maioria dos patógenos tem sua multiplicação reduzida a 10 °C, sendo que 4 °C está abaixo da temperatura mínima de multiplicação. A contagem bacteriana total apresenta o menor tempo de geração a 30 °C, sendo que a 3,6 °C a velocidade de multiplicação bacteriana é mínima em ostras naturalmente contaminadas.
O período necessário para eliminar 90% da contaminação em águas salinas varia conforme os micro-organismos envolvidos. Neste caso, em ostras, o tempo necessário para eliminação de Salmonella é de aproximadamente 56 a 80 horas. Estas ostras contaminadas, devem passar por um processo de depuração, a qual esta associada ao tratamento da água com recirculação em um sistema equipado com ultravioleta e água tratada com cloro.
Figura 3: Tanque utilizado para depuração de ostras produzidas em Paranaguá/PR. Fonte: Everson Bressan-AENotícias.
O gênero Salmonella pertence à família Enterobacteriaceae. Esses organismos são quimiorganotróficos, anaeróbios facultativos com metabolismo tanto fermentativo, como respiratório. São patógenos causadores de febre tifóide, febre entérica, gastroenterites e septicemia (infecção sistêmica severa). São também responsáveis pelos grandes surtos de gastroenterites de ocorrência mundial, apresentando uma dose infectiva a partir de 102 UFC/g de carne, dependendo da linhagem.
A Salmonella sp. é amplamente distribuída na natureza, sendo encontrada principalmente no trato intestinal do homem e de animais de sangue quente e frio, com exceção dos peixes, moluscos e crustáceos, que podem contaminar-se após a pesca ou extração.
Países com elevadas taxas de produção de moluscos bivalves exigem, em suas regulamentações, a ausência do gênero Salmonella nas ostras.
No Brasil, os surtos de doenças veiculadas por consumo de ostras contaminadas certamente ocorrem, porém os altos índices de subnotificação acompanhados ao elevado número de turistas de diversas regiões do Brasil e do mundo contribuem para a falta de um maior conhecimento destes dados.
Portanto, considerando que o consumo de ostras in natura pode representar um perigo à saúde do consumidor, o monitoramento da sua qualidade microbiológica é fundamental nas áreas de cultivo e, principalmente, nos pontos de comercialização, tendo em vista que a estocagem inadequada pode elevar os níveis de contaminação.
Como resultado disso, o GIA desenvolve vários projetos com o intuito de avaliar toda a cadeia produtiva da ostreicultura em diversas regiões do Brasil. O principal foco destes projetos está na avaliação das condições microbiológicas das ostras tanto produzidas como comercializadas, resultando em informações das etapas da produção desses animais até chegar ao consumidor final.
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