Aquicultura multitrófica:
Cultivo consorciado de camarões marinhos e macroalgas
Por: André Luiz Vicente
Publicado em 12/12/14
A rápida expansão da produção aquícola mundial, em especial, impulsionada pelos sistemas de cultivo intensivos, está diretamente associada a possíveis impactos ambientais que demandam práticas sustentáveis que viabilizem a produção do ponto de vista econômico e ambiental. Pesquisas demonstram que somente 25% do aporte de nutrientes presente nos sistemas intensivos de cultivo são absorvidos pelas espécies cultivadas, no cultivo de camarões marinhos esse percentual é ainda menor. Dessa forma, o manejo de nutrientes caracteriza-se como uma importante ferramenta de controle, quanto ao fornecimento de alimento exógeno na carcinicultura comercial.
A saturação de nutrientes (eutrofização) oriunda da alimentação exógena excedente em viveiros de cultivos de camarão marinho, incluindo os resíduos dos animais, pode causar uma série de problemas ao sistema incluindo o decréscimo na produção de fito e zôoplâncton, organismos fundamentais para a manutenção das formas jovens e principalmente na depleção do oxigénio dissolvido. Os resíduos provenientes da atividade, podem variar em quantidade e qualidade, dependendo principalmente das espécies cultivadas, da tecnologia e do sistema de cultivo empregado, da qualidade do alimento ofertado e também das práticas de manejo aplicadas nos viveiros.
Neste sentido, as macroalgas, organismos autotróficos que utilizam a luz solar para mobilizar os nutrientes inorgânicos disponíveis no sistema para produzir biomassa, caracterizam-se como uma alternativa ambiental e comercial de alta viabilidade. A sanitização dos efluentes de viveiros de cultivo de camarões pelas macroalgas, favorece de maneira controlada, a reutilização em outros ambientes de cultivo de organismos aquáticos ou ainda, esses efluentes podem ser lançados em meio receptor natural. Os cultivos integrados de camarão e macroalgas têm sido implementados com sucesso em vários países do mundo, em especial nos Estados Unidos e em países da América Latina, Central e Ásia (Figura 1). Outra importante forma de utilização das macroalgas é na alimentação dos camarões. Diversos estudos demonstram a eficácia de várias espécies de macroalgas na nutrição de camarões marinhos como forma de redução na oferta de alimento exógeno.
A escolha da espécie de macroalga a ser utilizada no sistema integrado deve seguir alguns critérios como, taxa de crescimento, facilidade de cultivo, controle e conhecimento do ciclo de vida, adequação ás características do ambiente de cultivo, viabilidade para o cultivo e manutenção em condições de laboratório e que sejam preferencialmente nativas (Figura 2). Além de atuarem na manutenção da qualidade dos viveiros e de servirem como alimento para os camarões, as macroalgas possuem elevado valor comercial, por possuírem uma substância natural chamada ficocolóide. Os ficocolóides (ágar, carragenana e alginato), são polissacarídeos extraídos da parede celular das algas, e possuem a propriedade de gelificação em solução aquosa. Devido às suas propriedades gelificantes, estabilizantes e emulsificantes, os ficocolóides passaram a ter grande aplicação nas indústrias alimentícia, farmacêutica e biotecnológica. Dados da FAO (2012), mostram que atualmente, cerca de 23,8 milhões de toneladas (peso úmido) de algas marinhas (Figura 3) são produzidas em todo mundo, sendo os principais países produtores a China, Indonésia e Filipinas, com um mercado estimado em aproximadamente US$ 600 milhões.
Figura 1. Sistema de cultivo integrado (Camarões e macroalgas) no México.
Figura 2. Ulva lactuca, espécie de macroalga nativa do litoral do Paraná.
Figura 3. Kappaphycus alvarezii, espécie mais produzida em todo mundo.
Bibliografia consultada:
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