Por: Camila Prestes dos Santos Tavares
A carcinicultura é uma atividade lucrativa praticada há mais de 40 anos no Brasil, porém ainda é muito sensível a surtos de doenças virais, principalmente da síndrome da mancha branca, causada por um vírus de DNA de fita dupla (WSSV). O WSSV induz rapidamente manchas brancas no exoesqueleto, apêndices e dentro da epiderme do camarão e pode causar até 100% de mortalidade nos camarões entre 3 e 10 dias após a infecção. Os camarões dependem da resposta imune inata para resistir à infecção por vírus, devido à falta de imunidade adaptativa, o que torna o uso de vacinas incapaz de combater o WSSV.
a tentativa de solucionar este problema na carcinicultura, alguns pesquisadores testaram outras opções de prevenção ou tratamento contra a infecção por WSSV, como o uso de produtos naturais de plantas, incluindo produtos fitoterápicos e extratos de plantas medicinais (Huang et al. 2019, Palanikumar et al. 2018, Citarasu et al. 2006). Os produtos naturais testados contêm alguns ingredientes bioativos especializados ou secundários, como alcalóides, flavonóides, glicosídeos, polifenóis e saponinas, para aplicação em doenças virais na aquicultura. Mais recentemente, um composto amplamente encontrado em plantas, chamado de C3007 (2-amino-4-(4-nitrophenyl)-5-oxo- 4H, 5H-pyrano[3,2-c]chromene-3-carbonitrile) tem mostrado resultados empolgantes para a carcinicultura.
O C3007 é um composto derivado de cumarinas, que são uma classe de produtos naturais de pequenas moléculas isoladas de plantas, bactérias, fungos e óleos essenciais. Por ser um composto estável, solúvel e de baixo peso molecular, sem efeitos colaterais adversos, se tornou um bom candidato para inibir a replicação do WSSV. Recentemente, Liu et al. (2021) analisaram o efeito do uso do composto C3007 no tratamento de larvas de camarão (L. vannamei) infectadas pelo vírus da mancha branca.
Neste estudo, as larvas de L. vannamei (comprimento total: 0,5 ± 0,04 cm; peso corporal: 4,2 ± 0,4 mg) foram mantidas em placa de cultura celular (6 poços) contendo água marinha esterilizada (28 ºC), e foram infectadas por imersão com o WSSV (1,6 x 105 cópias virais/μL) e expostas ao C3007 em diluições de até 10 mg/L por 72 horas. No grupo controle negativo foi utilizado 0,2 mg/L de DMSO (Dimetilsulfóxido).
Os resultados mostraram que quando o WSSV foi co-incubado com o composto C3007, as taxas de sobrevivência das larvas de L. vannamei aumentaram de acordo com o aumento da dose de C3007 (Figura 1A). Além disso, o C3007 também reduziu significativamente a carga viral de WSSV (Figura 1B). A melhor dose de C3007 testada nesta etapa para suprimir a replicação do WSSV e aumentar a sobrevivência dos camarões foi de 10 mg/L.
Figura 1. (A) A taxa de sobrevivência de camarões infectados com WSSV foi analisada sob tratamento de 0,31 a 10 mg/L de C3007 em 72 horas. (B) A quantificação no número de cópias do genoma viral de WSSV foi testada por exposição ao composto C3007. O número de cópias do genoma viral nas amostras foi quantificado por RT-qPCR.
Os resultados obtidos por Liu et al. (2021) mostraram que o uso de C3007 na água de cultivo dos camarões diminuiu a replicação de WSSV e aumentou a sobrevivência dos camarões infectados. No entanto, os autores observaram que C3007 sofreu uma degradação significativa após 48 e 72 horas na água de cultivo, que resultou no aumento da taxa de mortalidade dos animais infectados por WSSV mesmo expostos ao C3007 (Figura 3A).
Uma vez que a degradação foi a principal limitação do uso do composto na carcinicultura, os pesquisadores testaram a imersão contínua de novas doses de C3007 para fornecer uma maior proteção às larvas de camarão. Na etapa de imersão contínua, os camarões foram pré-incubados com WSSV (1,6 x 105 cópias virais/μL) por 24 horas e depois foram transferidos para novos poços com 10 mg/L de C3007 (Figura 2). A cada 24 h, a cumarina foi adicionada e atualizada sucessivamente durante três dias.
Figura 2. Diagrama esquemático que descreve o fluxo de trabalho da etapa de pré-incubação com imersão contínua.
Como resposta, a imersão contínua de C3007 resultou na redução adicional de 20% na mortalidade dos camarões infectados por WSSV após renovação sucessiva da dose. Além disso, a renovação da dose de C3007 suprimiu a replicação de WSSV ao longo de todo o período testado.
Figura 3. (A) Curva de sobrevivência dos camarões pré-infectados com WSSV (B) Curva de sobrevivência dos camarões pré-infectados com WSSV submetidos a renovação da dose de C3007 (tratamento) ou DMSO (controle) a cada 24 horas. (C) Quantificação do número de cópias do genoma de WSSV a cada 8 horas. Cada valor está representado como a média ± desvio padrão.
Em conclusão, o novo composto natural chamado C3007 é adequado para inibir a replicação de WSSV e reduzir a mortalidade dos camarões em sistemas estáticos de aquicultura. Os resultados de Liu et al. (2021) são muito empolgantes, pois mostram que o C3007 pode ser usado como um potencial agente para tratar e prevenir a infecção por WSSV na carcinicultura. Esperamos que, em breve, possamos ter boas notícias sobre a aplicação em escala comercial.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CITARASU T, SIVARAM V, IMMANUEL G, ROUT N AND MURUGAN V. 2006.
Influence of selected Indian immunostimulant herbs against white spot syndrome virus (WSSV) infection in black tiger shrimp, Penaeus monodon with reference to haematological, biochemical and immunological changes. Fish Shellfish Immunol 21: 372-384.
HUANG AG, TU X, QI XZ, LING F, ZHU B AND WANG GX. 2019. Gardenia jasminoides Ellis inhibit white spot syndrome virus replication in red swamp crayfish Procambarus clarkii. Aquaculture Aquaculture 504: 239-247.
LIU L, SHAN L-P, YAN M-C, LIU G-L AND CHEN J. 2021. Infection of WSSV shows potential promise of a novel antiviral amino-nitrophenyl medicine for application in culture of shrimp seedling. Aquaculture 534: 736283.
PALANIKUMAR P, DAFFNI BENITTA DJ, LELIN C, THIRUMALAIKUMAR E, MICHAELBABU
M AND CITARASU T. 2018. Effect of Argemone mexicana active principles on inhibiting viral multiplication and stimulating immune system in Pacific white leg shrimp Litopenaeus vannamei against white spot syndrome virus. Fish Shellfish Immunol 75: 243-252.